Sabemos o quanto a tecnologia nos
beneficia. Hoje, no entanto, preciso falar sobre questões alarmantes. O uso
excessivo dos eletrônicos pode viciar as pessoas, causando danos ao cérebro,
similares aos de drogas como cocaína e álcool.
Como identificar os sintomas da dependência?
Se o seu filho prefere ficar no
tablet em uma festa, reuniões com amigos ou familiares, sinal vermelho! Uma das
consequências da dependência é a diminuição ou piora do contato social com
amigos e familiares. Costumam dizer que todos são chatos, ou melhor, que tudo é
chato; mal cumprimentam as pessoas, demonstrando descaso, irritação e mal
humor.
Outro sintoma é a falta de interesse
em outras atividades. Conheço um casal que levou os filhos para a Disney e só
lá perceberam o quanto eles estavam viciados! Não havia neles alegria ou
entusiasmo. Tudo, como eles diziam, era “normal”. E a ansiedade de voltarem
para o hotel ficou evidente. Para quê? Para continuarem jogando. Os jogos
eletrônicos fazem uma “cócega” no cérebro, e nada, além disso, causa o mesmo
prazer.
Foto:
Daniel Mafra/cancaonova.com
Ficou inconformado com isso? É assim
com os outros vícios também. Como entender, por exemplo, alguém trocar a
família para estar no bar? Ou trocar uma cama quentinha para estar na
cracolândia? A dependência acarreta mudanças no cérebro, elevando a dopamina
(neurotransmissor associado à experiência de prazer), fazendo com que o
dependente queira sentir essa sensação o tempo todo.
Assim como as outras drogas, quando o
dependente fica abstinente, manifesta sintomas muito desagradáveis como
irritabilidade, ansiedade, alterações de humor e alterações de comportamento,
podendo tornar-se manipulador, com o intuito de estar próximo de seu objeto de
dependência novamente. Em casos extremos, podem chegar a fortes explosões,
agredindo quem lhe impeça de usar o eletrônico, por exemplo.
Cortar o mal pela raiz
Quanto à manipulação, tenho o exemplo
de uma mãe e seu filho de quatro anos, muito inteligente, sensível e amoroso:
“Meu filho baixou um joguinho no celular e voltava da escola jogando. Percebi
que bastaram 15 dias para ele estar viciado naquele jogo. Meu marido fez uma
pequena viagem e levou com ele o celular. Ao entrar no carro, depois da escola,
a primeira pergunta que ele fazia era: ‘Quando o papai vai voltar?’. Era uma
ansiedade sem tamanho! Só quando o pai chegou, vi que o desespero era para
pegar o celular dele, e o abraço foi apenas educado. Dando-me conta disto,
proibi-o imediatamente de jogar. Dois dias se passaram e, enquanto voltávamos
da escola, meu filho disse inusitadamente: ‘Mamãe, eu te amo tanto!’. Respondi,
mas a intuição de mãe fez com que eu olhasse pelo retrovisor mais atentamente.
Ele pegou o celular escondido de mim, e estava apenas tentando me enganar”.
Sabiamente, essa mãe percebeu o
problema e cortou o mal pela raiz. Seu filho pode jogar de vez em quando, uma
ou duas vezes na semana, por uns quarenta minutos apenas. A OMS (Organização
Mundial da Saúde) orienta que o tempo máximo em eletrônicos deve ser de duas
horas por dia. Eu, como psicóloga e mãe, oriento que as crianças não podem
jogar todos os dias, mesmo que seja por meia hora. Radicalismo de minha parte?
Ora, os estudos científicos constataram que o vício em eletrônicos é similar ao
alcoolismo. Como você julgaria uma pessoa que, depois do trabalho, todos os
dias passasse no bar e ficasse bebendo por meia hora? Não diríamos que ele é
alcoólatra? Entenderam a gravidade?
Algumas crianças e adolescentes têm
usado os eletrônicos para fugir de problemas (muitas vezes, familiares) ou
aliviar sentimentos de culpa, impotência, depressão e ansiedade. O desempenho
escolar também cai, mas não a ponto de reprovação na maioria dos casos, pois
eles sabem que, se ficarem em recuperação ou reprovarem, provavelmente, serão
punidos com o risco de ficarem sem o eletrônico. Mentir fará parte do jogo,
escondendo dos pais o tempo que ficam nos eletrônicos versus o tempo que ficam
estudando.
Na Inglaterra, o medo de ficar sem
celular já tem nome: “nomofobia” (no + mobile + fobia). Um estudo científico
comprovou que a nomofobia gera angústia, falta de interesse em outras coisas,
mudanças comportamentais, isolamento entre outros.
Tecnologia como babá
Os pais são financiadores da
dependência, com tablets, celulares e jogos de última geração. Há pais que usam
a tecnologia como uma babá. Outro dia, nas férias, eu estava na sala de espera
da pediatra de meu filho, onde havia um menino muito pequeno, acompanhado de
sua mãe, totalmente vidrado no tablet. Sem me identificar como psicóloga, mas
apenas como mãe, puxei assunto (como quem não quer nada) sobre o perigo desses
jogos para os nossos filhos. Ela perecia estar muito atenta à tudo o que eu lhe
dizia, parecendo estar conscientizando-se da gravidade, o que me deixou feliz.
Mas, no final, vejam o que ela disse: “Se eu tirar os jogos, não sei o que vou
fazer com ele nas férias”.
Infelizmente, ela não sabe ser mãe.
Seu filho é dependente da “droga”, e eu ousaria dizer que a mãe é codependente.
É assim com o álcool também. Essa mãe precisa ser ajudada da mesma forma que
familiares de viciados em outras drogas. Mal sabe ela que esse vício está
interferindo diretamente no desenvolvimento emocional, podendo causar sérios
transtornos na fase adulta de seu filho.
O Hospital das Clínicas de São Paulo
tem tratado a dependência em tecnologia de forma similar ao tratamento de
outros vícios, dando suporte emocional para os familiares, com reuniões
semanais em grupo, tratamento psiquiátrico, sendo que, nos casos mais graves, é
necessário também medicação.
Dependência de eletrônicos
Na Espanha, as autoridades já estão
introduzindo programas para evitar e tratar a dependência dos eletrônicos. A
Alemanha já incluiu em seu Programa de Educação este tema. Na China, Coréia e
Singapura já tratam a questão como uma ameaça à saúde pública, devido aos
níveis epidêmicos observados. Segundo pesquisas, 6% da população usa os
eletrônicos de forma compulsiva. Na França, nos processos de divórcios,
observou-se que muitas provas envolviam alguma questão de mídia digital ou
internet, em 50% dos casos.
A dependência de eletrônicos vem
cobrir um vazio que já existia (aliás, todas as drogas camuflam um vazio). Não
se engane, não são só as novas tecnologias que fazem isso! A TV ligada, quando
todos chegam em casa à noite, disfarça um silêncio. Não há conexão entre as
pessoas, conexão de afeto, de partilha, alegria, olhar, carinho. São apenas
pessoas, lado a lado, numa “sala de espera”, esperando o dia seguinte chegar.
Para mim, o maior prejuízo que a
dependência de eletrônicos causa é o vazio da alma. Todos sentem, dentro de si,
em algum momento, um vazio existencial. À princípio, esse vazio pode assustar,
mas é nele que nos questionamos a respeito do sentido de tudo, e vemos que
muitas “coisas” do mundo não têm grande significado. É nesse momento, onde
parece faltar sentido, que se encontra o sentido maior, que transcende tudo.
Por onde começar?
Talvez, seja mais simples do que você
pensa. Os eletrônicos roubam de nossos filhos a sensibilidade, a empatia, a
criatividade, a capacidade de amar, enfim, a alma. Precisamos resgatar tudo
isso nas pequenas coisas. Há alguns dias, fui ao Mercado Municipal de Curitiba
(SC) com meu filho. Ele estava encantado, mexendo nos sacos de grãos, cheirando
frutas desconhecidas, experimentando novos sabores e novos sons. Havia
professores de tango dançando e convidando pessoas a dançar. Meu filho me obrigou
a experimentar! Fiz por ele. Rimos muito disso. Computador não tem cheiro nem
gosto, nem toque, não tem vida, não tem risada verdadeira, não tem afeto. Em
resumo, é trocar o virtual pela realidade da vida. Boa troca, não é? É só
viver.
Adriana Potexki
Adriana Potexki é escritora e autora
dos livros ‘A cura dos sentimentos em mim e no mundo’ e ‘A cura dos sentimentos
nos pequeninos’. Com formação em Psicologia, ela é terapeuta certificada pelo
EMDR Institute, palestrante internacional e blogueira do site ‘Sempre Família’,
do Grupo GRPCom.
Fonte: Canção Nova
Nenhum comentário:
Postar um comentário