Ser cristão incomoda muito
Católicos devem tomar consciência de sua responsabilidade

A Igreja foi posta, mais uma vez, como espetáculo diante do mundo. Todos os olhos estão voltados para
ela e proclama-se, especialmente quando vista de fora, uma grande crise.
Aproveita-se a oportunidade para que as muitas bandeiras de uma parcela
permissiva da sociedade sejam levantadas. Na cabeça de muitos, vale apostar tudo
para ver o que se pode colher, como se a Igreja de Jesus Cristo fosse um balcão
de informações turísticas, quem sabe um parlamento democrático aberto a todos ou
as orientações morais viessem a ser decididas pelo voto da maioria. A grande
renovação da Igreja, ou acontece a partir do coração de cada cristão, com a
força da permanente conversão, ou será indevida e mentirosa, pois ela não pode
ser infiel ao seu Senhor.
Ser
cristão incomoda, e muito, começando mesmo por aqueles que desejam professar
sua fé com coerência, em tempos nos quais a perseguição se volta furiosa,
especialmente contra os católicos. Não estamos mais em época de cristandade. Com
certeza, os cristãos católicos devem tomar consciência de sua responsabilidade e
se decidirem a ser sal, luz e fermento, com qualidade de vida e testemunho, indo
além das valiosas e reconhecidas devoções para serem presenças qualificadas,
capazes de transparência da inigualável mensagem evangélica, dispostos a superar
os próprios limites e pecados.
Sabemos que o mistério da iniquidade está presente onde quer que existam
pessoas humanas. Falta muito para que todos os homens e mulheres, de qualquer
religião ou fé, vejam vencidos em si ou na vida social a maldade que se espalha.
Também para nós vale o chamado contínuo à conversão, tanto que, nos dias da
Quaresma, a Igreja inteira, consciente de que foi resgatada pelo Sangue do
Cordeiro imolado, canta em sua oração: "Humildes, ajoelhados na prece que a fé
inspira, ao justo Juiz roguemos que abrande o rigor da ira. Ferimos por nossas
culpas o Vosso infinito amor. A Vossa misericórdia do alto infundi, Senhor. Nós
somos, embora frágeis, a obra de Vossa mão; a honra do Vosso nome a outros não
deis, em vão. Senhor, destruí o mal, fazei progredir o bem; possamos louvar-Vos
sempre e dar-Vos prazer também. Conceda, ó Deus Uno e Trino, que a terra e o céu
sustém, que a graça da penitência dê frutos em nós. Amém" (Hino de Laudes para
os Domingos da Quaresma). É bom que o mundo saiba que nos reconhecemos
pecadores, suplicamos a misericórdia de Deus, somos, continuamente, chamados à
conversão e nos empenhamos em buscar as formas de vida cristã e as estruturas
necessárias ao testemunho autêntico de Jesus Cristo.
No terceiro domingo
da Quaresma, a Igreja proclama e medita o Evangelho de São Lucas,
no capítulo treze, versículos um a nove. Jesus forma Seus discípulos e as
pessoas que d'Ele se aproximam. Cabe-lhes estar atentos aos acontecimentos. O
primeiro deles é de ordem religiosa, quando alguns galileus são mortos por
Pilatos quando ofereciam sacrifícios. O segundo é um acidente, quando uma torre
cai sobre algumas pessoas. É mais ou menos como as notícias novas ou
requentadas, que correm pelo mundo afora e também no boca a boca das
conversas.
Em nossos dias, pululam acusações de toda ordem contra a
Igreja e os católicos. Os fatos negativos tenham sua devida apuração e, quando
comprovados, as pessoas sejam devidamente responsabilizadas. Também os desastres
públicos são passíveis de verificações e providências cabíveis. No entanto,
envolvidos diretamente ou não nos dois tipos de eventos, todos sejam provocados
a tirar as lições devidas. Trata-se de perguntar o que Deus quer nos dizer com
os fatos.
Jesus propõe a conversão nos dois casos. Se existem cristãos
que agem mal, que comecem uma vida nova, transformem sua mentalidade e suas
práticas. Se qualquer um de nós se encontra distante dos fatos e
responsabilidades, pergunte-se como pode ser melhor e viver melhor, mesmo em
áreas totalmente diferentes. Quando uma obra desaba na sociedade, um incêndio se
alastra, as ruas estão esburacadas ou os serviços são de baixa qualidade, mesmo
quem não tem poder para mudar tudo pode começar por si mesmo ou perto de sua
casa. O lixo que cada um recolhe, de forma adequada, pode ser uma pequena, mas
indispensável ajuda, como também a direção segura e defensiva no trânsito e
outras práticas. Vale, como sempre, ouvir Jesus: “Pensais que esses galileus
eram mais pecadores do que qualquer outro galileu, por terem sofrido tal coisa?
Digo-vos que não. Mas se vós não vos converterdes, perecereis todos do mesmo
modo. E aqueles dezoito que morreram quando a torre de Siloé caiu sobre eles?
Pensais que eram mais culpados do que qualquer outro morador de Jerusalém? Eu
vos digo que não” (Lc 13,2-5). Os frutos da conversão se manifestem em nova
mentalidade e novas práticas de vida!
A Igreja tem a alegria de oferecer
ao mundo, depois de oito anos de trabalho intenso, o exemplo luminoso que tem
sido o até agora Papa Bento XVI, que acaba de renunciar. Certamente, incomodou
muita gente, mas edificou crianças, jovens e adultos, homens e mulheres de todos
os quadrantes do mundo. Sua palavra e seu comportamento foram retilíneos,
coerentes com o lema escolhido, “colaborador da verdade”, um cristão autêntico,
apaixonado pela Verdade, que é Jesus Cristo. É a esta verdade que queremos
converter-nos! É a esta verdade que estará a serviço o novo Papa a ser
eleito!
Com a Igreja e o mundo, peçamos juntos: “Senhor Jesus, Pastor
eterno, fundastes a Igreja para ser, no mundo, o Sacramento da Salvação, na
perfeita comunhão de amor, e destes a Pedro a tarefa de criar a unidade entre
vossos filhos e filhas. Amparai, Senhor, a vossa Igreja que, sustentada pelo
vosso Santo Espírito, espera confiante a escolha do Sucessor de Pedro, que nos
sustentará na mesma fé, da qual, na mesma Igreja, recebemos no batismo. Não
permitais, Senhor, que ventos de doutrinas contrárias venham a nos confundir.
Sustentai a nossa fé e mandai, sem demora, aquele que conduzirá a Barca da
Igreja pelos caminhos da história, em nosso tempo, para a honra e glória do
Vosso nome, Vós que sois caminho, verdade e vida. Amém!”
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém - PA
Dom
Alberto Taveira foi Reitor do Seminário Provincial Coração
Eucarístico de Jesus em Belo Horizonte. Na Arquidiocese de Belo Horizonte foi
ainda vigário Episcopal para a Pastoral e Professor de Liturgia na PUC-MG. Em
Brasília, assumiu a coordenação do Vicariato Sul da Arquidiocese, além das
diversas atividades de Bispo Auxiliar, entre outras. No dia 30 de dezembro de
2009, foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Belém - PA.
Fonte: Canção Nova
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